Supersubfaturado

Friday, December 31, 2004

Fernando Mendes, que medo

"Quero beijar tua boca/moder tua língua/furar teus olhos/te acorrentá-la"
Que medo dessa música do Fernando Mendes. Ele é a antítese do pernambucano normal, esse apaixonado daí de cima. Porque existe aquela divisão, de apaixonados e doentes, que existe até em torcida de time de futebol. O FM dessa letra é dos poucos que não sabem separar uma da outra. Ela é a trilha dos homicidas passionais que cometem crimes sem saber por quê.

Comments:

Galega...

O pernambucano é um tipo barrigudo e pinguço e que ama as mulheres. Deveria ser a definição típica de um macho, mas é só a de um pernambucano. Porque, sabe-se lá por qual motivo, eles têm o prazer de expressar isso – seja nas músicas ou na vida mesmo. Para eles, nada mais vale que o amor pela galega.
***
A primeira lição foi de Fred Zero Quatro, em 1994, no elogio ao amor preguiçoso de Musa da Ilha da Grande. Mais tarde, amarrou-se na paixão de botequim e violão de Meu Esquema ("ela é o meu domingão de sol"). Depois tem o Xico Sá, o homem mal-diagramado que declama e faz cair de amores as mulheres de São Paulo. É dele o repente de todas as noites, bêbadas ou não.
E tem o nosso presidente, que é daqui também. Para ele não há amor maior que o da galega. Em Entreatos, ele senta no tapete com a Marisa, de mãos dadas como um noivo pós-casamento. E há a cena em que descreve o dia em que saiu da concessionária com uma TL, de banco reclinável, só para impressionar a galega, que, sim, ficou impressionada. Essa paixão cinquentona dos dois em nada lembra a relação profissional de Fernando e Ruth. Essa paixão é nossa e de Pernambuco.
***
A garçonete de coque e cabelo avermelhado passeava no restaurante mexicano sem descobrir que aquele penteado e aquele tom saíram de moda em 1996 ou 1997 – quando mulheres falíveis como ela se esforçavam para dizer que não eram tão falíveis assim, tatuando um ou outro dragão no braço. Mas deu vontade de desamarrar aquele coque, me aprofundar naquele vermelho e me importar pouco se o ano não é aquele do penteado. E de publicar um anúncio chamando-a para dividir um puxadinho num canto qualquer, aqui ou em Itaquera. Mas fiquei no daí de cima.

Comments:

Procuro

Mulher solteira, modelo 96/97. Bom estado. Tatuagem opcional. Que beba, chore e deixe chamá-la de galega, mesmo que não tenha cachos loiros. Tratar aqui.

Comments:

Thursday, December 30, 2004

Um trono para Wayne

No sábado, meio cheio do Natal em Salvador (a mina do albergue extorquiu 40 reaus de cada um para um festinha meia-boca. Não participei, mas tomei cerveja dos gringos sem trocar os presentes), fui ao cinema assistir Bob Esponja. O filme era comentário de amigos no domingo anterior e uma das missões de fim de ano. Quer saber? Melhor ficar com os episódios e etc, que são bem mais interessantes. Do filme, resta o retardado do Bob e a princesinha dublada pela Scarlett Johanson. O Patrick tem aquele desempenho de sempre, meio o Dedé Santana do Bob. Mas a cena dele apaixonado pela princesinha é demais.
Só não digo que vale o filme porque o melhor é quando começam a subir os créditos. E daí surge Sponge Bob e Patrick contra alguma coisa, que é a música feita pelo Flaming Lips especialmente para o filme. Por uma suposição, penso que deve ter sido feita para uma cena especial, cortada logo depois de o filme ser editado. Deve aparecer nos extras do DVD.
Nela, Wayne Coyne continua com o seu sotaque de Neil Young e o som mezzo esquizofrênico mezzo suave de sua banda. Desde que nasceram, no quase hardcore dos anos 80, eles apenas experimentam a evolução. Depois de construir um clássico, Transmission from the Sattelite Heart, emendaram com um trabalho obscuro (Zareeka, quatro CDs para serem ouvidos simultaneamente que ninguém ouviu, numa viagem sem comparações na história do rock) e outro clássico, ainda maior e melhor – Soft Bullettin, de 1999. Yoshimi Battles of Pink Robots, de 2002, não é melhor nem pior, segue na mesma trilha. Não é clássico, pois pouco acrescenta ao inventado três anos antes. Mas é o trabalho que conduziu o FL de volta ao mainstream. Sim, eles tiveram a sorte do Pulp em 1996, ao serem escalados para tapar o buraco de outra banda num dos megafestivais britânicos (no caso, os estourados White Stripes). E, por fim, chamaram a atenção por shows sangrentos e com bichinhos de pelúcia, o que em resumo pode parecer besta e bestial, como técnicos de futebol adoram ser tratados no auge e no auge das crises.
Na busca por bandas no cume, eu não encontro paralelos à posição do Flaming Lips. Eles são a melhor banda de rock no mundo hoje. A que mais evoluiu, a que mais dá orgulho de gostar (assim como no futebol dá orgulho de torcer pelo Corinthians depois da campanha de 2004). Mal comparando, parece que aquela ascensão do U2 pós-Actung Baby, quando tudo que eles tocavam pareciam virar algo dourado. Era assim nas turnês, nas trilhas sonoras, nos discos. Já o Flaming Lips contenta-se em ser grande apenas no Reino Unido. Dane-se. A música deles o tornam mais cosmopolitas que o papa. Pode ser algo misturado na pele de seus bichos fofos.

Comments:

Wednesday, December 29, 2004

Eu quero é falar de música

...porque 2004 foi político e sentimental demais.

Comments:

Monday, December 27, 2004

Fritar, só os pés

Antes que o sol queimasse ainda mais meus neurônios e me transformasse num autêntico representante das tropas do axé, decidi me exilar em um rancho à beira-mar em Olinda. Aqui dá a impressão de que o mundo gira, ainda, com o povo discutindo que há para se discutir na rua.
Cadê o malandro falandro em inglês e amarrando fitinha no meu pulso sem eu pedir? Ora, aqui não há. As meninas aqui não mandam tchau, mas tem um sorriso para distribuir sempre que um pedido (que não é o de um sorriso) é feito ou realizado. Pois esse movimento realiza desejos, sim.
Cadê o pôster do Antonio Carlos, não o Mussum (grande mestre) mas o Magalhães?. Ora, o jornaleiro aqui da frente tem coceiras só de ouvir esse nome. Aqui quem manda é a Luciana, do PC do B, numa das cinco cidades administradas pelos comunistas e a maior de todas. Lá na BA ninguém entende como o paulista vota no Maluf até cansar (e parece que enfim eles cansaram) mas não cansa de devotar amor ao painho. Vai entender. Aqui do lado eles têm João Paulo, que, além de boa gente, ganhou de lavada ainda no primeiro turno e foi para SP ajudar a Marta. Putz, e foi daqui que saiu o Otto, por quem larguei a irritação pela quase devoção – foi massa o que ele fez no VMB, como foi também o resultado de Sem Gravidade, um dos cinco grandes CDs do ano.
Eu tenho a disposição de gostar das gêmeas Recife/Olinda antes de jamais ter pisado os pés sobre o asfalto quente daqui. Só o meu pé frita. Ainda bem. Preciso de ar para os neurônios.

Comments:

Friday, December 24, 2004

Tudo vai mal, tuuuuuuudo

Dezembro é o mês das manias do Roberto. Do especial de ano-novo e do disco anual. Este ano, como no da morte de Maria Rita, não, mas, ao contrário daquele, quando não houve nem sinal de produção do velho RC, este despejou um DVD sem graça – o show deve ter sido o máximo; a gravação, não. Mas Roberto, o querido, o velho, o amigo, vez ou outra dá de tecer reencontros. Em um deles, com o toca-CDs, tive de volta à mão parte da infância perdida em compactos de 7''.
O melhor deles é o de 71. É uma obra de soul gospel, de baladas e desabafos. Ele ainda não havia decidido apenas pelos bolerões que fizeram dele a fama dos anos 70. Todos Estão Surdos faz hoje mais sentido que de costume (o amigo que ele suplica a volta é o nosso amigão Jesus Cristo). E o Caetano cantando pela voz de Roberto em Como Dois e Dois São Cinco é de arrepiar. Nunca um desabafo funcionou assim, como um telefone sem fio. O mano baiano monta uma letra para levar a mensagem para aqueles que entenderem, por quem jamais um censor poderia então entender.
Tem uma coincidência no meio do reencontro que é o livro do PAS. Mas é coincidência, porque ele acontece após o estímulo do camarada Zoyd, principalmente o daquela noite maluca do show do Mundo Livre S/A, quando o louco deu de ouvir a música do Ronnie Von para eu jamais tirar do meu toca-discos (a versão do Otto, que é a grande figura deste 2004 que se encerra agora). Mas o livro do PAS é viajante demais, cai demais no próprio back fumado pelo jornalista. Não dá para compartilhar do mesmo vício que o colega do quarto andar. Já o Roberto dá a abertura para todas as interpretações possíveis. E é bom você ouvir para ter a sua da próxima vez que a gente conversar.

Comments:

Wednesday, December 22, 2004

Vem pro swing da côr

Taí eu mordendo outra vez a língua. Da última vez que pisei nesta terra, jurei que jamais voltaria a fazê-lo. Pois, à primeira vista, Salvador parece ótima. Mulatas dando tchau da janela do ônibus, um albergue jóinha do lado do Pelourinho e serviços decentes que não esperava encontrar por aqui. Mais a solidão de brinde.
Eu me enganei ao não notar o Pelourinho da mesma forma que o argentino alegrou-se ao notar minha camisa do Boca e perguntar se era de sua terra ou não – detalhe: ele vestia a camisa do Flamengo. O mais interessante é o nome do café-internet, Pizza. Mais um detalhe: eles não servem pizza, apesar do nome.
Tá, eu tô devendo um monte de coisas e queria ter disposição para pagar. Mas não tenho. Tô na preguiça. Tô na Bahia. Me dá um tchau de brinde?


Comments:

Friday, December 17, 2004

Lembra de quando a gente lembrava das coisas?

Em tempos de celebrar a década perdida, corremos o risco de perdemos mais 10 anos. Gente sem nem idade para ter vivido o passado agora embarca na onda saudosista. Boa música é a dos anos 80. Séries ok só as que passavam nas tardes de Sessão Aventura. Passatempo favorito é o de lembrar o que de tão bom o passado tinha que hoje não há mais.
Enfim, é um saco. Depois de revivals menos ensurdecedores – a disco revalorizada pela house, o grunge ressuscitando o hard rock setentista e mesmo os anos 80 bebendo na fonte jovemguardista ou naquelas cores berrantes do psicodelismo pré-hippie –, o monotematismo nos toma de assalto. Nem se fala de outro assunto. Testamos a BMX Pantera, então.
Abro o guia da bolha e caço o que há de mais interessante para fazer hoje. O Rádio Táxi toca Eva e Um Amor de Verão num clube qualquer. A companhia é de Evandro Mesquita e Paulo Ricardo. O mercado de livros deságua lançamentos mapeando o passado recente. Um deles é do tipo “você lembra” das bobagens que costumávamos gostar porque éramos crianças ou, com mercado fechado e a democracia recém restabelecida, nem tínhamos chance de discordar. Outro tenta provar, por a mais b, que de perdida a década nada tinha. Mas ganhamos alguma coisa?
No meio dessa década hoje pretensa e falsamente recuperada, a finada Bizz publicava um suplemento explicando que acreditávamos numa era que não era a nossa. A new wave, que incluía bobagens que deram de celebrar, era uma invenção de TVs e cadernos culturais em época de falta de assunto. Como aqui, ela não existia em mais nenhuma parte.
Calma aí, mas em outras épocas o passado era só referência, não? Alguém lembra de o Tremendão participando do Clip Clip? Ou de, de uma hora para outra, o Made In Brazil virar a referência da garotada?
A gente perdeu a infância e sabe mais do que sabíamos. Mas preferimos encobrir a vista e embaralhar lembranças com a peneirinha de embalar limão, daquelas que usávamos para acostumar o cabelo para trás. Pena que, nesse pacote, caibam os fios e os neurônios saudosistas. Em 20 anos, podemos amar o tempo em que a gente lembrava das coisas.

Comments:

Tuesday, December 07, 2004

Nem sub sem super

"In Utero" recebeu mais críticas negativas que positivas quando lançado, em outubro de 1993. Era o terceiro álbum do Nirvana, ignorando a coletânea lançada poucos meses antes. No ar estava a comparação com o anterior, "Nevermind", e a birra com a banda, então disposta a calar o sucesso conquistado no verão anterior. Bastaram sete meses para que as opiniões mudassem de lado – e o filho maldito virou testamento belo e insano com a morte do criador. Quer saber? Nem uma coisa nem outra: "In Utero" é um bom disco de rock, mais de Kurt que do resto da banda. Fala dele, as músicas compostas são sobre ele e assim fica difícil avaliá-lo com álbum de uma banda em ebulição. Não é uma obra-prima, tampouco um disco para ser metralhado e ignorado. Talvez para Kurt tivesse o status de negar mais de três vezes a demente exposição do trabalho anterior. Em resumo: para ele, não era nem sub nem superfaturado. Era só mais um.
***
O exemplo acima é típico de como a gente (pessoas normais e não-críticas de música ou arte) podemos às vezes cometer injustiças, sérias ou não. Isso vale para os discos que a gente compra, desmerecendo os alertas dos iluminados dos jornais. Eu quero saber o que é melhor para mim, ora. Então fica o registro: a gente aqui tem o poder de decidir. Este blog é um apelo para a própria opinião. Colaborações serão sempre aceitas (e negadas, também), e vale falar da banda que o crítico metralhou, do filme que foi destruído na resenha de sexta do jornal e da namorada que um dia você achou que era a mulher da sua vida e virou aquela megera em cinco dias.
Vale tudo, mesmo. O critério é o de achar que algum dia alguém fez uma avaliação errada, e isso pode incluir você, sim. Espero colaborações.

Comments:

Cara e queixo

Ela tinha cara e queixo de que um dia seria mais do que foi àquela noite. De uma forma ou de outra, roubou copos do rapaz ao lado para distribuí-lo com quem mais gostava – e, naquela noite, era eu esse cara. Nos dias seguintes, colou sua mão à minha enquanto caminhavamos pela praia, ela sem muita vontade de comer, eu sem muita vontade de estar em outro lugar. E assim os dias seguiram, e mais de uma vez fui bloqueado pela idéia de declarar que aquele era o dia que eu queria há tanto tempo, e que ela era a mulher que um dia eu vi marcado em um ou outro sonho.
Vi o tempo passar e os anos evaporarem em casos mal-resolvidos – e ela estava em um deles. Na noite em que esbarrei no seu pé sem perceber que a ela pertencia, notei que ou o tempo havia passado rápido demais ou sido mais cruel que de costume. Diferenças bloquearam o amor e vi aquela tempestade transformar-se em um sopro. Não era dela a escolha feita há três anos, e eu estava novamente frustrado, à caça de mulheres que fossem mais do que aquilo.
Nesse dia percebi que a minha opinião era uma arma. Ela poderia desmontar noites quentes de inverno com lembranças mal-construídas.

Comments: